Skip to Main Navigation
OPINIÃO9 de março de 2023

Qual o impacto de empréstimos bancários sobre as mudanças climáticas?

Empresas que atuam em setores com efeito no clima podem mudar de credor

Pablo Acosta
Folha de S. Paulo

Existe a expectativa de que os riscos climáticos e as políticas climáticas tenham um grande impacto no sistema financeiro. Por exemplo, nos últimos anos, as autoridades financeiras exigiram que os bancos incorporassem os riscos climáticos em suas estruturas de gestão de risco, inclusive em seu Processo Interno de Avaliação de Adequação de Capital, o chamado ICAAP.

Enquanto alguns formuladores de políticas estão explorando o uso de medidas prudenciais para direcionar fundos de atividades de alto carbono para setores verdes, o principal objetivo dos requisitos de capital prudencial é aumentar a solidez e a estabilidade das instituições financeiras. Se as medidas prudenciais relacionadas ao clima recém-implementadas afetarão os empréstimos bancários e a atividade empresarial permanece uma questão empírica em aberto com importantes implicações políticas.

Por exemplo, estas regulações podem apresentar custos associados ao capital bancário que restrinjam a capacidade dos bancos de apoiar empresas em setores expostos ao clima. É possível que tais resultados, mesmo que não intencionais, sejam desejáveis na medida em que promovem o desinvestimento em algumas atividades de alto carbono. No entanto, restringir a oferta de crédito a empresas com exposição significativa ao risco de mudança climática pode ser prejudicial, pois limita sua capacidade de financiar a transição para uma economia menos intensiva em carbono.

Em um artigo recente, o Banco Mundial avaliou uma política introduzida em 2017 no Brasil que exigia que bancos sistemicamente importantes – com ativos superiores a 10% do PIB – incorporassem riscos ambientais em suas avaliações de adequação de capital. Foram utilizados dados de empréstimos bancários e uma taxonomia de setores ambientalmente expostos para examinar a incidência da política no crédito bancário, na atividade econômica das empresas e nas emissões de gases de efeito estufa (GEE). A conclusão foi de que a introdução do novo ICAAP de 2017 levou a uma realocação de empréstimos por grandes bancos fora dos setores expostos.

A mudança no crédito a setores expostos por grandes bancos também se deu na forma de vencimentos de empréstimos mais curtos, já que a proporção de empréstimos de curto prazo para esses setores aumentou substancialmente após a reforma. Em contrapartida, os bancos isentos do exercício do ICAAP aumentaram o volume total de crédito e a maturidade dos empréstimos a empresas em setores expostos após a regulamentação. De fato, percebeu-se que, no nível agregado, a expansão dos empréstimos dos bancos menores às empresas dos setores expostos compensa a contração do crédito dos bancos maiores.

O estudo também achou que as empresas em setores expostos podem mudar de credor e substituir totalmente os empréstimos entre os bancos, ou se a contração de crédito que experimentam leva a resultados reais mais baixos, incluindo sua capacidade de reduzir sua pegada de carbono.

Além disso, foi detectado um impacto moderado desta política na atividade econômica real. Não foram encontradas diferenças no nível de emprego e nas emissões totais de GEE das empresas expostas em municípios onde os bancos afetados pelo exercício ICAAP tiveram a presença mais forte (tratamento) em relação aos municípios com menor exposição a bancos sistemicamente importantes (controle).

O estudo também apresenta evidências, no entanto, de alguma realocação de trabalho entre pequenas e grandes empresas em setores expostos. Em particular, os resultados sugerem que nos municípios tratados, há um declínio no número de empresas formais e o tamanho médio das empresas aumenta após a política.

Consistente com esse achado, a parcela do emprego e a parcela das microempresas dentro dos setores expostos diminuem após a política em municípios com maior incidência de grandes bancos. No geral, as evidências sugerem que a contração do crédito a empresas expostas ao meio ambiente por bancos sistemicamente importantes é amplamente compensada pelo aumento da oferta de outros bancos.

Por último, os efeitos negativos da contração do crédito parecem concentrar-se nas empresas de menor dimensão, aquelas que têm menos capacidade para substituir empréstimos junto dos bancos.

Em conclusão, a mudança na exposição a riscos ambientais de bancos grandes para pequenos em nosso ambiente destaca a importância de proteger todo o sistema financeiro ao implementar medidas prudenciais relacionadas ao clima. Embora muitas empresas estejam isoladas do choque de oferta (podem substituir o crédito entre os credores), o ajuste das carteiras dos bancos em resposta aos requisitos de capital relacionados ao clima pode afetar desproporcionalmente os mutuários que normalmente têm acesso limitado ao crédito, como as pequenas e médias empresas (PMEs). Uma possível consequência não intencional das medidas prudenciais que devem ser acompanhadas de perto é o impacto negativo na inclusão financeira.

Uma agenda de pesquisa ambiciosa seria estudar o impacto do capital relacionado ao clima em um cenário multinacional. Desde 2020, o Banco da Inglaterra, o Banco Central Europeu e outras agências de supervisão introduziram diretrizes para a gestão de riscos climáticos e ambientais. Seria interessante verificar se as características específicas do país são uma fonte adicional de heterogeneidade (além das características dos bancos e das empresas) no impacto dos requisitos de capital relacionados ao clima na oferta de crédito.

_________________________________________

Esta coluna foi escrita em colaboração com os economistas Alvaro Pedraza, Faruk Miguel Liriano e Claudia Ruiz, do Banco Mundial

Blogs

    loader image

Novidades

    loader image