Preservar riqueza natural é valorizar a diversidade sociocultural e ecológica, além de incentivar a redução das desigualdades
Pablo Acosta
Folha de S. Paulo
O Brasil corre o risco de perder a Amazônia. Desde o surgimento da agricultura, há cerca de 12 mil anos, os humanos vêm gradualmente alterando — e destruindo — as paisagens naturais do planeta. Apenas cerca de 13% da terra ainda permanece em seu estado selvagem. No Brasil, a fronteira agrícola continua avançando cada vez mais rumo ao “pulmão do mundo”, destruindo ecossistemas milenares, que abrigam uma biodiversidade excepcional e 300 mil indígenas, colocando em risco o clima regional e global. Felizmente, muita atenção tem sido dada à proteção do bioma, inclusive com o apoio de mais de 60% da população do Brasil, país que abriga dois terços da Amazônia.
Com áreas protegidas e territórios indígenas em seus nove estados amazônicos, o Brasil é pioneiro na conservação florestal. Diversos municípios foram incluídos em listas de exclusão, enquanto produtores de soja e pecuaristas comprometeram-se a criar zonas livres de desmatamento. O sistema brasileiro de monitoramento por satélite em tempo real permite ao país detectar rapidamente o desmatamento ilegal e mobilizar as autoridades.
No entanto, ao longo dos últimos sete anos, o desmatamento voltou a crescer, fazendo com que a Amazônia deixasse de ser um sumidouro de carbono e se transformasse num emissor líquido desse gás. Há o risco real de que cheguemos a um ponto de inflexão que desencadearia a morte permanente de grandes extensões florestais.
Quanto custaria fornecer incentivos para deter o desmatamento? O primeiro passo é estimar o valor monetário da Amazônia. É impossível avaliar todos os componentes da floresta em pé, mas fizemos uma estimativa a partir de valores mínimos.
Os valores privados incluem o turismo e a produção sustentável de madeira, castanha-do-pará, borracha e outros bens.
Já os valores públicos regionais envolvem benefícios ecossistêmicos para todo o continente, por meio da regulação do clima local e da precipitação (os “rios voadores” nascidos na Amazônia, que beneficiam todo o continente), da polinização e da proteção das florestas intactas contra incêndios.
São valores públicos globais aqueles que representam a maior parte do valor da Amazônia, em grande parte devido a sua enorme capacidade de armazenar CO2, que, segundo uma avaliação conservadora, vale US$ 40 por tonelada. Além disso, um considerável “valor de opção” — uma espécie de arca do tesouro medicinal para a indústria farmacêutica, por exemplo — está associado à biodiversidade da Amazônia.
Nossos cálculos mostram que a Amazônia gera um valor anual de pelo menos US$ 317 bilhões, o que supera largamente as estimativas do valor associado ao corte dessas florestas para extração de madeira, pecuária, soja ou mineração, algo entre US$ 43 bilhões e US$ 98 bilhões.
Como esse valor pode ser monetizado? Recursos de doação (como o Fundo Amazônia, apoiado pela Noruega e pela Alemanha) podem ser de grande ajuda. Em termos globais, parece haver apoio para isso: as estimativas indicam que os brasileiros estariam dispostos a pagar US$ 120 milhões por ano, ao passo que os americanos pagariam US$ 340 milhões, e os canadenses, US$ 38 milhões. Além disso, os mercados de carbono oferecem oportunidades crescentes para financiar a conservação.
Uma grande parte do financiamento deve ir para os governos do Brasil e dos estados da Amazônia Legal para proteger a floresta e promover desenvolvimento sustentável.
Quanto devemos pagar? A Amazônia brasileira encolhe a uma taxa de 0,3% ao ano. Os pagamentos podem ser feitos apenas para a parte da floresta que corre risco real de desmatamento, vinculando a compensação necessária pelo desmatamento evitado ao valor de oportunidade de conversão da floresta para outros usos.
Se a área estimada da floresta em risco em determinado ano fosse de 12.200 km² (área perdida em 2021) e se essa área fosse totalmente protegida, de US$ 5 bilhões a US$ 10 bilhões precisariam ser desembolsados, além do custo de aplicação das leis de proteção florestal.
São incentivos consideráveis. Um valor intermediário de, digamos, US$ 7 bilhões corresponde a 0,4% do PIB nacional. Contudo, se considerarmos apenas os nove estados da Amazônia Legal brasileira, o valor equivale a 6% do PIB da região, ou 23% dos orçamentos anuais desses estados, o que é muito significativo.
Preservar essa riqueza natural é valorizar a diversidade sociocultural e ecológica, além de incentivar a redução das desigualdades regionais em um bioma vital para o planeta.
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Esta coluna foi escrita em colaboração com meus colegas do Banco Mundial Marek Hanusch, economista líder de programa no Grupo de Práticas para Crescimento Equitativo, Finanças e Instituições, e Jon Strand, economista e consultor.