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OPINIÃO 3 de junho de 2022

Desafios para a universalização do acesso a água e saneamento

Uma nova fase para desenvolver e consolidar o setor de água e saneamento no Brasil se tornou realidade. O marco legal aprovado em 2020 representa uma mudança regulatória importante que pode trazer benefícios econômicos e operacionais para o setor. Nesse sentido, semana passada a Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental realizou a Semana da Água do Brasil 2022. O evento é planejado para reunir instituições governamentais, profissionais da área, o setor privado, acadêmicos e organizações internacionais.

Em pauta, questões e oportunidades de planejamento e concessões privadas, regulações, criação de infraestrutura de água e saneamento rural e urbana eficientes, e mecanismos financeiros inovadores. O estímulo a todas as partes que apoiam esse importante setor é um passo muito importante para identificar soluções e gargalos relacionados à implementação do marco legal. Embora o país esteja no caminho certo, ainda há muitos desafios em termos de reformas das políticas públicas para alcançar os objetivos de universalização do acesso a água e saneamento.

Desde a última Semana da Água realizada em 2020, o mundo vivenciou a pandemia global da Covid-19 que resultou em enormes prejuízos econômicos, sanitários e à vida humana. Só no Brasil, os lockdowns causaram perdas para as empresas prestadoras de serviços de água e saneamento de US$ 1 bilhão a US$ 1,3 bilhão. Nas regiões Norte e Nordeste do Brasil, que registram os maiores déficits na cobertura e qualidade dos serviços de água e saneamento, os impactos da Covid-19 foram mais onerosos para a população mais pobre do que no restante do país. Essas condições, junto com as frágeis capacidades fiscais e financeiras dos estados e municípios, criam lacunas financeiras e de investimentos constantes.

Uma inovação importante do novo marco legal é a atribuição de um papel mais robusto à Agência Nacional de Águas (ANA), que passa a definir diretrizes normativas nacionais para os serviços de água e saneamento. Dessa forma, espera-se que o país consiga coordenar e fortalecer as capacidades das agências regulatórias de implementar as normas atualizadas do setor. Além disso, há instrumentos econômicos e mecanismos de políticas públicas que precisam ser modificados ou reformulados (como, por exemplo, os subsídios tarifários) a fim de maximizar a disponibilidade dos recursos financeiros necessários nos três níveis de governo (federal, estadual, municipal) visando satisfazer a demanda crescente pelos serviços.

Para que o marco legal de água e saneamento seja implementado efetivamente no Brasil, devem prevalecer condições favoráveis ​​e políticas sólidas. Especificamente, melhorar as finanças dos fornecedores de água e saneamento no Brasil prova criar resiliência contra turbulências econômicas e financeiras. Em 2021, o Banco Mundial realizou um estudo detalhado sobre as vulnerabilidades financeiras de prestadores de serviços públicos e privados de água e saneamento em toda a América Latina e descobriu que prestadores de serviços com planejamento financeiro resistiram melhor aos choques financeiros.

Outra política sólida ocorreu durante a pandemia da Covid-19 e a profunda crise fiscal. O país foi um dos poucos na região a implementar medidas ambiciosas de mitigação desses impactos na sustentabilidade operacional das prestadoras de serviços. As principais medidas foram: prorrogar o vencimento das contas de água e esgoto, proibir a suspensão dos serviços, isentar os grupos especialmente vulneráveis de pagamento, congelar as tarifas, promover o pagamento de contas e o atendimento ao cliente de forma remota.

Para que o novo marco legal seja eficaz, o governo federal deverá participar de forma assertiva na articulação com as unidades subnacionais e na criação de incentivos para que os proprietários dos serviços e os municípios possam estar alinhados com as diretrizes nacionais. No entanto, o governo brasileiro também deveria usar melhor os recursos públicos alocados ao setor, e mobilizar e alavancar financiamento adicional por meio de mecanismos financeiros inovadores que possam reduzir os riscos da participação do setor privado e das finanças do setor público.

Entre os principais desafios que o Brasil enfrenta estão as alocações voláteis do orçamento público para o setor e a baixa eficiência de gastos dos governos locais. As alocações do orçamento público para serviços de água e saneamento representam uma parcela menor do PIB. O Brasil vem investindo menos da metade do que é necessário para a universalização até 2033. O setor também sofreu com a alta subexecução do orçamento federal, uma lenta reforma tarifária para aumentar as receitas e um fraco direcionamento da política de subsídios cruzados na última década.

Para isso, no entanto, as instituições do setor de água e saneamento deveriam ter capacidades técnicas sólidas e recursos financeiros suficientes. Isso é especialmente importante para o sucesso de parcerias público-privadas e do novo marco legal aprovado em 2020. A nova legislação abre oportunidades para programas federais de incentivo ou programas especiais de apoio aos municípios.

Promover a melhoria de instituições, regulamentações, gastos e a resiliência do setor de água e saneamento depende ainda de informações relevantes para avaliar o progresso e de parâmetros de desempenho de referência. Ferramentas analíticas recentes foram desenvolvidas pela Prática Global de Água do Banco Mundial como referência para todos os países da América Latina e do Caribe em termos de segurança hídrica e riscos e a recuperação dos serviços de água e saneamento para as concessionárias na era pós-Covid-19.

Considerando que o governo sozinho provavelmente não conseguirá vencer o desafio da universalização do acesso a água e saneamento no país até 2033, a infraestrutura e a substituição de ativos dos serviços de água e saneamento devem estar na linha de frente das políticas estratégicas de desenvolvimento nacionais e locais.

Esta coluna foi escrita em colaboração com os colegas do Banco Mundial Luis Alberto Andres, líder do setor de Infraestrutura no Brasil, e Christian Borja-Vega, economista sênior.

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