Skip to Main Navigation
OPINIÃO 8 de março de 2021

Tempo para acção mais ousada para melhorar a igualdade de género em Moçambique

Ao assinalarmos o Dia Internacional da Mulher no dia 8 de Março, convido-vos a reflectir e a celebrar as realizações da mulher em Moçambique e no mundo. Moçambique tem muitas mulheres de sucesso que têm enfrentado inúmeros desafios e, por mérito próprio, merecerem reconhecimento ao nível nacional e internacional. Desde as combatentes de libertação, até a artistas, atletas, mulheres de negócios, cientistas, entre outras, Moçambique é dotado de modelos inspiradores para as jovens raparigas. A demonstração de que “sim é possível” é muito importante para as raparigas, dadas as suas muitas barreiras únicas para alcançar o sucesso.

Como mulher, também tive muitos modelos a seguir na minha vida. O mais importante sendo a minha mãe que valorizava a educação, o trabalho árduo e a simplicidade acima de tudo. Não havia nenhuma diferenciação de tarefas com base no género. Os meus pais não podiam se dar ao luxo de criar esta diferenciação, pois tinham de cuidar da lavoura, enfrentando uma série de adversidades aliados a um clima pouco favorável. Todas as mãos eram fundamentais para se alcançar o sucesso.

O Dia Internacional da Mulher não é apenas uma celebração. Este dia é um convite à acção. É um lembrete da importância de garantir que a mulher tenha as mesmas oportunidades de contribuir na economia tanto quanto na família. Porém, não é suficiente discutir esta questão apenas uma vez por ano! Todos valorizamos a mulher nas nossas vidas, seja ela nossa mãe, irmã, tia, filha – e valorizamo-la todos os dias por aquilo que ela significa e faz por nós. Vamos dar esta mesma importância a toda a mulher – afinal, ela representa a metade da população mundial!

Acredito sinceramente que um grande obstáculo para o empoderamento da mulher seja a falta de compreensão em torno do significado de empoderamento. Um erro comum é que o empoderamento é definido como a substituição de poder – os homens devem perder o seu poder para que as mulheres possam ganhar o seu (poder). Isto não poderia estar longe do que eu, como mulher, percebo sobre a igualdade de género.

Muitas mulheres com quem tenho interagido querem espaço e oportunidades; oportunidades para concorrer a vagas de emprego; oportunidades para aceder empréstimos bancários para iniciarem os seus negócios; e entre as raparigas, clamam por oportunidades de aprendizagem sem assédio, para que possam concentrar-se nos estudos. Ademais, as raparigas também querem oportunidades de obter orientação profissional, bolsas de estudo e encorajamento para frequentar Ciências Exactas e tornarem-se cientistas. Imagino o quanto tenha custado à Marie Curie descobrir a radioatividade, que levou a grandes avanços na medicina - além de ganhar seus dois prêmios Nobel.

Para se alcançar o objectivo de igualdade de oportunidades precisamos de esforços conjuntos para acelerar a recuperação e reduzir as lacunas significativas no seio da mulher nos principais indicadores do capital humano. Embora Moçambique tenha um bom quadro legislativo e estratégico para promover a igualdade de acesso de homens/mulheres ao desenvolvimento do capital humano, a implementação destes instrumentos tem sido retardada e a maioria dos principais indicadores demonstram estagnação.

Evidências bem documentadas mostram que a desigualdade de género em Moçambique é aguda, com o país a ocupar a posição 127 entre 162 países no Índice de Desigualdade de Género. A violência contra a mulher é galopante: um-terço de raparigas adolescentes na faixa etária de 15 anos declaram ser sobreviventes de violência física; 46% dizem ser sobreviventes de violência doméstica, sexual ou emocional por parte de seus parceiros; e 70% denunciam ter sido molestadas na escola.

Muitas raparigas jovens em Moçambique não têm a oportunidade de viver plenamente a sua infância despreocupada ou de prosseguir as suas aspirações. Moçambique possui a 10ª maior taxa de casamentos infantis e uma das mais elevadas taxas de gravidezes na adolescência ao nível mundial. A prevalência contraceptiva de apenas 25% entre as mulheres adultas resulta numa taxa de fertilidade global de 4,9 crianças por mulher, fomentando a pobreza e privando a economia moçambicana de investimentos e dinamismo para metade da sua população.

Como resultado, as raparigas são mais propensas a abandonar a escola do que os rapazes. Em média, as mulheres em Moçambique alcançam apenas 1,4 anos de frequência escolar, dois anos abaixo da frequência média de 3,4 anos entre os homens, que também é muito baixa. O baixo nível de escolaridade, particularmente entre as mulheres, tem um impacto no fraco rendimento escolar e na saúde da criança, uma vez que as mulheres moçambicanas, em geral, carregam esta responsabilidade ao nível familiar, de acordo com as normas sociais do país. E embora a participação da força laboral feminina (77%) possa parecer razoável à primeira vista, um olhar mais atento revela que as mulheres trabalham principalmente no sector informal, especialmente na agricultura (63%) e geralmente são mal remuneradas. Apenas 6% das mulheres são trabalhadoras assalariadas, contra 24% dos homens. O emprego assalariado privado é direccionado aos homens, embora a maior parte esteja no sector dos serviços e apenas 33% nos sectores tradicionalmente dominados pelos homens, tais como a mineração, produção e construção.

Desta forma, é tempo de tomarmos uma acção ousada para nivelar o campo de actuação, se realmente pretendemos de forma decisiva, reduzir a pobreza. As sociedades inclusivas posicionam-se melhor na luta contra a pobreza. Há anos que ficou estabelecido com base em evidências que a igualdade de oportunidades não só traz benefícios sociais como também gera uma boa economia. Países com maior igualdade de género apresentam melhores resultados social e economicamente, ponto final.

Claramente, ainda temos muito trabalho por fazer.

É por esta razão que, ao nível do Banco Mundial, tenho insistido bastante para incutir um sentido de urgência em torno das questões referentes ao género. O nosso objectivo ao embarcarmos nestes esforços é apoiar o governo e outros actores de desenvolvimento para aumentar substancialmente o acesso da mulher e da rapariga aos serviços de saúde sexual e reprodutiva, eliminar o fosso entre género `a todos os níveis na educação, combater a violência baseada no género, abordar as disparidades de género nas oportunidades de emprego e apoiar a mulher a ultrapassar as normas sociais e de género que lhe impedem de ter voz na sociedade.

Por exemplo, o Banco Mundial está a apoiar o Governo nos seus esforços rumo a uma maior igualdade de oportunidades, através de uma série de intervenções, tais como o Projecto “Aproveitamento de Dividendos Demográficos” em curso, que inclui intervenções orientadas para uma maior capacitação de raparigas adolescentes e mulheres jovens; o Programa de Reforço dos Cuidados de Saúde Primários em Moçambique, que visa melhorar a saúde reprodutiva e materna; o Projecto de Melhoria de Aprendizagem e Empoderamento da Rapariga ainda em preparação, que visa apoiar as raparigas a completar o ensino primário e a frequentar o ensino secundário; e o Projecto “Investir no Capital Humano e Prevenir o Agravamento de Conflitos em Moçambique”, em preparação, que visa apoiar o capital humano e o empoderamento da mulher no Norte de Moçambique.

Ao adoptarmos uma postura mais arrojada em relação à igualdade de género no nosso trabalho, precisamos de acções colectivas para alcançarmos o sucesso, tendo em conta que o empoderamento da mulher é uma responsabilidade de todos. Como em outros grandes desafios do nosso tempo, este é também o momento de um individualismo colectivo. Por outras palavras, as nossas acções enquanto indivíduos são fundamentais. Como diz o ditado, se não és parte da solução, és parte do problema. De igual modo, como indivíduos, somos parte de um todo e as nossas acções importam tanto para as nossas famílias, as nossas comunidades, como para a sociedade em geral. Quanto mais estivermos conscientes dos nossos preconceitos e das nossas limitações e da necessidade de enfrentar a cada questão, mais estaremos a abraçar a mudança, e melhor seremos como uma sociedade.

Quanto a mim, faço um apelo à acção; uma acção ousada e consequente para que os nossos filhos, rapazes e raparigas, possam herdar um mundo melhor. Vamos celebrar o Dia Internacional da Mulher, porém, vamos assegurar que a acção seja desencadeada ao logo de todo o ano!

Este opinião foi publicado pela primeira vez em Club of Mozambique.

Api
Api