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Brasil: aspectos gerais

O Brasil apresentou forte recuperação em 2021-2022, após crescimento negativo no período 2014-2019 e o impacto terrível da Covid-19. O PIB cresceu, em média, 3,3% ao ano em termos reais no período 2001-2014, impulsionado pelo boom internacional de commodities e pela expansão de seus programas sociais, entre outros. A queda nos preços das commodities, a turbulência política e os desafios estruturais não resolvidos levaram a uma recessão econômica, que provocou queda no crescimento real do PIB de -0,3%, em média, entre 2014 e 2019 e -3,3% em 2020 devido à pandemia de Covid-19. A retomada do crescimento foi da ordem de 5,0% em 2021 e 2,9% em 2022, impulsionada pelo forte estímulo fiscal, pela bem-sucedida campanha de vacinação, pelo mercado de commodities favorável e pela demanda por serviços.

O crescimento se mantém estável em 2023 e deve alcançar 2,6%, impulsionado pela agricultura e pelo aumento do consumo pelas famílias e pelo governo. De acordo com o IPC, a inflação desacelerou para 4,6% em agosto de 2023 – dentro da meta – após um pico de 12,1% em abril de 2022. Isso permitiu ao Banco Central reduzir a taxa de juros para 12,75% em setembro (de uma alta de 13,75), e há expectativa de novas reduções. O déficit em conta corrente foi de 2,5% do PIB nos 12 meses até julho de 2023, financiado principalmente pelos ingressos líquidos de IED a 2,4% do PIB. As reservas internacionais ficaram em 17,1% do PIB (US$ 345,5 bilhões) em julho de 2023. Após uma elevação em 2022, os balanços fiscais mostraram alguns sinais de declínio em 2023, com a diminuição de receitas e aumento de transferências sociais. Em julho de 2023, o déficit primário de 12 meses do setor público não financeiro atingiu 0,8% do PIB, a partir de um superávit de 1,3% em 2022. A dívida pública chegou a 74,1% do PIB em julho de 2023. A médio prazo, espera-se que as perspectivas orçamentárias fiquem ancoradas no novo marco fiscal, que prevê a manutenção do superávit primário a partir de 2024 e a estabilização da dívida até 2026.

No entanto, os desafios estruturais persistem, e a trajetória de crescimento do país está muito abaixo daquela de seus pares. A produtividade se manteve estagnada na indústria de transformação e de diversos outros serviços - que empregam mais de 90% da força de trabalho – mas o crescimento da agricultura em larga escala ajudou a promover a segurança alimentar e a redução da pobreza entre partes da população rural. Os rígidos e recorrentes gastos públicos ainda impedem investimentos críticos em todos os setores.  Espera-se que o crescimento do Brasil oscile em torno de 1,3% a 2,4% nos próximos quatro anos, bem abaixo da China, Índia e Turquia.

As taxas de pobreza se mantiveram estagnadas entre 2014 e 2022. A pobreza foi reduzida pela metade (com a saída de 27 milhões de brasileiros da pobreza) de 2001 a 2012, graças ao crescimento econômico, ao aumento da formalização do emprego e à expansão das políticas sociais, mas a crise iniciada em 2014 levou à estagnação do crescimento da renda entre os mais pobres e a poucos avanços na redução da pobreza. O Brasil implementou um ousado conjunto de medidas emergenciais durante a pandemia de Covid-19 para ajudar a proteger as populações mais vulneráveis, em grande parte pela expansão do programa Bolsa Família (BF), [1] e pelo aumento das oportunidades de emprego como parte da recuperação econômica. De modo geral, as estimativas para os níveis de pobreza são de 24,3% em 2022, comparáveis aos níveis de 2014, após atingir o pico de 28,4% em 2021.

A perspectiva para a redução dos níveis de pobreza em 2023 parece promissora, mas é necessário acelerar a criação de empregos e fazer investimentos mais significativos em capital humano para reduzir as desigualdades mais marcantes. Espera-se que o aumento real do salário mínimo, a grande reformulação do Bolsa Família e a introdução planejada de benefícios adicionais para famílias com filhos reduzam ainda mais a pobreza em 2023. No entanto, o Brasil continua sendo um dos países mais desiguais do mundo. Em 2021, o coeficiente de Gini do país chegou a 0,53, tendo o 1% mais rico concentrado cerca de metade da riqueza do país. As desigualdades são marcantes entre as regiões, particularmente entre o norte mais pobre e o sul mais rico, mas também dentro de cidades e entre áreas rurais e urbanas. Famílias chefiadas por mulheres, afro-brasileiros e populações indígenas estão super-representadas entre os pobres, pois enfrentam resultados piores no mercado de trabalho e têm lacunas salariais prolongadas (mesmo entre setores e níveis de competências comparáveis). Hoje, quase metade das crianças brasileiras, a futura força de trabalho do país, está crescendo em famílias pobres.

A atualização do Diagnóstico Sistemático do País (SCD) em 2023 identificou quatro desafios para o desenvolvimento:

 

O primeiro é criar oportunidades para todos os brasileiros, com foco no crescimento impulsionado pela produtividade e em uma economia competitiva. Atualmente, os níveis de produtividade nas indústrias de transformação e serviços do país ainda estão abaixo dos níveis de vários países da América Latina, e o crescimento econômico tem sido lento, o que dissocia o Brasil de seus pares. O modelo de crescimento brasileiro continua a depender da acumulação de fatores, ou seja, do aumento dos postos de trabalho, do capital e da terra. Esse modelo oferece um crescimento restrito, uma vez que com a queda no crescimento populacional, a baixa poupança doméstica limita a formação de capital e a acumulação de terras se manifesta no desmatamento. O Brasil precisa aumentar sua poupança e taxas de investimentos. Porém, como um país de renda média alta, ele deve dar ênfase especial ao crescimento da produtividade total dos fatores (PTF): a PTF caiu 0,8% entre 2014 e 2022, especialmente em setores não relacionados a commodities.

 

O segundo desafio para o desenvolvimento é desenvolver uma estratégia centrada nas pessoas, que aumente a capacidade de geração de renda dos pobres. O Brasil tinha um quinto da população em situação de pobreza crônica antes da pandemia, e a crise da Covid-19 expôs ainda mais a vulnerabilidade das famílias brasileiras a choques. Os ganhos de anos anteriores na capacidade de geração de renda das famílias não se repetiram. Em 2019, considerou-se que um quinto dos brasileiros viviam em pobreza crônica devido à falta de ativos básicos para alavancar sua renda. Embora o acesso à educação tenha melhorado, a qualidade continua a ser uma preocupação, uma vez que o aluno médio apresenta baixo desempenho em avaliações nacionais e internacionais. A pandemia piorou ainda mais os resultados de aprendizagem e desigualdade devido ao fechamento de escolas e às maiores taxas de evasão escolar, o que provocará consequências duradouras na produtividade futura das crianças.

A atualização do SCD prevê que a recuperação das perdas causadas pela pandemia ao capital humano pode levar até 13 anos. O acesso às competências relevantes para o mercado de trabalho, especialmente nas áreas de ciência, engenharia e tecnologia, é limitado e há lacunas de gênero. A matrícula no ensino superior está diretamente relacionada à renda familiar, o que reforça a desigualdade. Ainda há lacunas no acesso básico aos serviços de saúde e saneamento. A posse da terra é distribuída de forma desigual, e os indivíduos de baixa renda são afetados por grande insegurança. Embora a inclusão financeira tenha melhorado, certos grupos ainda enfrentam dificuldades para conseguir acesso a ativos financeiros.

O terceiro desafio é destravar o potencial do país como economia verde. O Brasil enfrenta perdas significativas, recorrentes e cada vez maiores em razão de eventos climáticos: em 2019, as perdas relatadas ultrapassaram R$ 22 bilhões, quase o dobro da média de longo prazo, de R$ 13,3 bilhões. As secas causam os maiores prejuízos econômicos, seguidas por inundações, cheias dos rios e incêndios florestais. Esses eventos impactam o agronegócio (o setor agrícola perde, em média, o equivalente a 1%% do PIB agrícola anualmente como consequência de eventos climáticos extremos), o setor de energia (que depende substancialmente da energia hidrelétrica) e as áreas rurais, mas também afetam de forma desproporcional os pobres que vivem em áreas rurais e têm poucas opções para se proteger dos desastres naturais, e os pobres em áreas urbanas,  especialmente aqueles que vivem em assentamentos informais.

O perfil das emissões de gases de efeito estufa do Brasil difere do de outros países, sendo a mudança no uso da terra /desmatamento (52%) e a agricultura (24%) os que mais contribuem. A terceira maior fonte de emissões, e a principal quando se trata de áreas urbanas, é o setor de energia, sendo o transporte responsável por 45% dessas emissões. Isso resulta, principalmente, da forte dependência do transporte rodoviário e de veículos dos combustíveis fósseis. É importante descarbonizar o setor de transportes para reduzir a demanda por esses combustíveis no país.

O Brasil apresentou avanços na redução do desmatamento entre 2004-2012, mas as taxas de desmatamento vêm aumentando de maneira constante desde 2014, tendo chegado a 11.568 km2 em 2022. Em 2023, as políticas públicas de apoio à agenda de proteção ambiental foram restabelecidas e já mostraram resultados positivos. Somente a Floresta Amazônica, com cerca de 60% de sua área em território brasileiro, presta serviços ecossistêmicos avaliados em no mínimo US$ 317 bilhões ao ano para o Brasil e o mundo. O desmatamento coloca esses serviços em risco, especialmente se for desencadeado um ponto de inflexão que cause impacto permanente na regeneração da floresta. A modernização das práticas de registro fundiário e incentivos para o uso mais sustentável da terra são cruciais para atender às necessidades ambientais do país.

O quarto grande desafio para o desenvolvimento é financiar o crescimento inclusivo do país por meio de um marco sustentável baseado em gastos mais eficientes, impostos mais adequados e um regime fiscal sólido. Reformas fiscais estruturais, incluindo a abordagem de questões estruturais persistentes em relação aos gastos e o aprimoramento do sistema tributário, serão fundamentais para que o país encontre maneiras de criar espaço para apoiar um novo modelo de crescimento inclusivo. Fatores como a folha de pagamentos e aposentadorias do setor público e o aumento da demanda por gastos com proteção social continuam a pressionar as finanças públicas. A gestão da massa salarial e previdenciária do serviço público é crucial, sendo os altos salários do governo federal e os déficits previdenciários estaduais fontes de preocupação. Os desafios na área de recursos humanos incluem disparidades salariais, estruturas fragmentadas e rígidas e a gestão inadequada do desempenho. O sistema tributário do país, altamente dependente do consumo de bens e serviços, tem espaço para uma tributação mais progressiva e para maior eficiência. O sistema de transferência intergovernamental precisa ser reformulado para abordar as lacunas horizontais entre os estados. Diversos governos estaduais e municipais estão enfrentando uma crise fiscal, no entanto, estados e municípios são responsáveis pela prestação de serviços básicos à população, como educação e saúde. É necessário fazer uma reforma administrativa abrangente, com foco nos aspectos fiscais, na governança e na qualidade da prestação dos serviços públicos.

[1]  Concebido como um programa de transferência condicionada de renda, o BF teve seu nome alterado para Auxílio Brasil no governo anterior, e algumas das condicionalidades tiveram que ser suspensas durante a pandemia.

Última atualização: 16 de outubro de 2023